quarta-feira, 19 de junho de 2013

Transporte público é ferramenta fundamental de inclusão

Muito bem, em várias cidades do Brasil os prefeitos voltaram atrás nos aumentos de ônibus devido ao intenso movimento nas ruas. Em São Paulo, o prefeito Haddad e o governador Alkymin anunciaram o retorno a R$ 3,00 das passagens de ônibus, trens e metrô. Mas isto é muito pouco como resposta aos incríveis momentos dos últimos dias.

Espero que governadores e prefeitos consigam construir um diálogo aberto com a população a partir do recuo no aumento do transporte coletivo e avançar projetos efetivamente transformadores da mobilidade e da inclusão que esta permite.

Vejam, não estou desprezando outros temas também importantes, mas somente tentando manter o foco. O movimento das ruas criou espaço social para a discussão da ocupação viária, o que há pouco tempo não seria possível dado o fetiche do automóvel.

Daí que é um bom momento para em Brasília o Mantega voltar atrás nos incentivos à compra de automóveis e a Dilma municipalizar a CIDE-Combustíveis (pelo menos nas regiões metropolitanas), vinculando ao mesmo tempo estes recursos a investimentos no transporte público.

E em São Paulo o Haddad:
- acelerar a implantação dos 150 km de corredores de ônibus previstos por sua administração (e, melhor, ampliar para 200km),
- convocar o governo do estado a ampliar a integração entre ônibus, metrô e trens e baratear a tarifa para usuários intensivos, gente que mora longe e trabalha e estuda no centro expandido,
- criar zonas/ruas de exclusão do uso de automóveis.

Tudo isto junto diminuiria o tempo gasto pelas pessoas no transporte público e certamente reduziria os custos do sistema de transportes.

Espero que eles estejam preparados. É hora de entender que a mobilidade é fundamental para a inclusão social e avançar.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

R$2.304,00 por ano para viajar com 7 ‘coleguinhas’ por 3 horas em somente 1m2


R$ 3,20 x 2 x 365 = R$2.304,00. Mais de dois mil e trezentos Reais por ano por um péssimo e saturado serviço público. Está explicado o por que das manifestações contra o aumento das passagens no transporte público urbano? Ou precisa mais?

Isto é o que gastam por ano os paulistanos para viajarem espremidos no transporte público, que nos horários de pico chega a ter uma densidade de 8 passageiros por metro quadrado. Me parece que qualquer um pode entender o descontentamento da população, mesmo os que viajam de carro ocupando mais de 10m2 por pessoa de área pública da cidade.

quarta-feira, 12 de junho de 2013

sem + palavras

Como vamos não conseguiremos limitar a temperatura global dentro de níveis seguros

Não fui eu quem disse, foi a Agência Internacional de Energia: “O mundo não está caminhando para cumprir a meta de longo prazo de limitação da elevação da temperatura média global em 2 °C como acordado pelos governos. As emissões globais de gases de efeito estufa estão aumentando rapidamente e, em maio de 2013, o nível de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera ultrapassou 400 partes por milhão pela primeira vez em centenas de milênios”.

Em relatório publicado nesta semana (10/06/2013) a AIE concorda com o grosso da produção científica recente e afirma que nosso clima já está mudando e que devemos esperar tanto a elevação do nível do mar quanto o aumento da frequência e da intensidade de eventos climáticos extremos como tempestades, inundações e ondas de calor. A Agência disse ainda que a análise das políticas implantadas ou em discussão aponta que é mais provável a temperatura média global de longo prazo se elevar entre 3,6 °C e 5,3 °C do que se estabilizar em 2 °C acima das temperaturas pré-industriais.

Mas não precisamos nos desesperar (ainda). Segundo a AIE a meta de 2 °C continua tecnicamente viável, embora “extremamente desafiadora”.

O consumo global de energia está no cerne do problema e a AIE propõe quatro grupos de ações para mantermo-nos dentro do limite perseguido de 2 °C de aumento da temperatura:
1 - Adoção de medidas específicas (eu diria extremas) de conservação de energia (49% da redução de emissões necessária);
2 - Limitação da construção e do uso das centrais elétricas a carvão mineral de tecnologia menos eficiente (21%);
3 - Minimização das emissões de metano (CH4) na cadeia produtiva de petróleo e gás natural (18%);
4 - Aceleração da redução a zero dos subsídios ao consumo de combustíveis fósseis (12%).

Do meu ponto de vista, as ações de 1 a 3 são até possíveis, embora não confie que sejam tão efetivas como a AIE sugere. Mais difícil será reduzir - ou idealmente zerar - os subsídios à produção e ao consumo de combustíveis fósseis, dada a força das indústrias desta cadeia de valor.

O relatório Redrawing the Energy-Climate Map pode ser obtido em www.worldenergyoutlook.org/energyclimatemap.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

AOS QUE AINDA SABEM SONHAR

Maravilhosa reflexão de Andre Borges Lopes publicada em www.advivo.com.br/node/1400276

O fundamental não é lutar pelo direito de fumar maconha em paz na sala da sua casa. O fundamental não é o direito de andar vestida como uma vadia sem ser agredida por machos boçais que acham que têm esse direito porque você está "disponível". O fundamental não é garantir a opção de um aborto assistido para as mulheres que foram vítimas de estupro ou que correm risco de vida. O fundamental não é impedir que a internação compulsória de usuários de drogas se transforme em ferramenta de uma política de higienismo social e eliminação estética do que enfeia a cidade. O fundamental não é lutar contra a venda da pena de morte e da redução da maioridade penal como soluções finais para a violência. O fundamental não é esculachar os torturadores impunes da ditadura. O fundamental não é garantir aos indígenas remanescentes o direito à demarcação das suas reservas de terras. O fundamental não é o aumento de 20 centavos num transporte público que fica a cada dia mais lotado e precário.

O fundamental é que estamos vivendo uma brutal ofensiva do pensamento conservador, que coloca em risco muitas décadas de conquistas civilizatórias da sociedade brasileira.

O fundamental é que sob o manto protetor do "crescimento com redução das desigualdades" fermenta um modelo social que reproduz – agora em escala socialmente ampliada – o que há de pior na sociedade de consumo, individualista ao extremo, competitiva, ostentatória e sem nenhum espaço para a solidariedade.

O fundamental é que a modesta redução da nossa brutal desigualdade social ainda não veio acompanhada por uma esperada redução da violência e da criminalidade, muito pelo contrário. E não há projeto nacional de combate à violência que fuja do discurso meramente repressivo ou da elegia à truculência policial.

O fundamental é que a democratização do acesso ao ensino básico e à universidade por vezes deixam de ser um instrumento de iluminação e arejamento dos indivíduos e da própria sociedade, e são reduzidos a uma promessa de escada para a ascensão social via títulos e diplomas, ao som de sertanejo universitário.

O fundamental é que os políticos e grandes partidos antigamente ditos "libertários" e "de esquerda" hoje abriram mão de disputar ideologicamente os corações e mentes dos jovens e dos novos "incluídos sociais" e se contentam em garantir a fidelidade dos seus votos nas urnas, a cada dois anos.

O fundamental é que os políticos e grandes partidos antigamente ditos "sociais-democratas" já não tem nada a oferecer à juventude além de um neo-udenismo moralista que flerta desavergonhadamente com o autoritarismo e o fascismo mais desbragados.

O fundamental é que a promessa da militância verde e ecológica vai aos poucos rendendo-se aos balcões de negócio da velha política partidária ou ao marketing politicamente correto das grandes corporações.

O fundamental é que os sindicatos, movimentos populares e organizações estudantis estão entregues a um processo de burocratização, aparelhamento e defesa de interesses paroquiais que os torna refratários a uma participação dinâmica, entusiasmada e libertária.

O fundamental é que temos em São Paulo um governo estadual que é francamente conservador e repressivo, ao lado de um governo federal que é supostamente "progressista de coalizão". Mas entre a causa da liberação da maconha e defesa da internação compulsória, ambos escolhem a internação. Entre as prostitutas e a hipocrisia, ambos ficam com a hipocrisia. Entre os índios e os agronegócio, ambos aliam-se aos ruralistas. Entre a velha imprensa embolorada e a efervescência libertária da Internet, ambos namoram com a velha mídia. Entre o estado laico e os votos da bancada evangélica, ambos contemporizam com o Malafaia. Entre Jean Willys e Feliciano, ambos ficam em cima do muro, calculando quem pode lhes render mais votos.

O fundamental é que o temor covarde em expor à luz os crimes e julgar os aqueles agentes de estado que torturaram e mataram durante da ditadura acabou conferindo legitimidade a auto-anistia imposta pelos militares, muitos dos quais hoje se orgulham publicamente dos seus crimes bárbaros – o que nos leva a crer que voltarão a cometê-los se lhes for dada nova oportunidade.

O fundamental é que vivemos numa sociedade que (para usar dois termos anacrônicos) vai ficando cada vez mais bunda-mole e careta. Assustadoramente careta na política, nos costumes e nas liberdades individuais se comparada com os sonhos libertários dos anos 1960, ou mesmo com as esperanças democráticas dos anos 1980. Vivemos uma grande ofensiva do coxismo: conservador nas ideias, conformado no dia-a-dia, revoltadinho no trânsito engarrafado e no teclado do Facebook.

O fundamental é que nenhum grupo político no poder ou fora dele tem hoje qualquer nível mínimo de interlocução com uma parte enorme da molecada – seja nas universidades ou nas periferias – que não se conforma com a falta de perspectivas minimamente interessantes dentro dessa sociedade cada vez mais bundona, careta e medíocre.

Os mesmos indignados que se esgoelam no mundo virtual clamando que a juventude e os estudantes "se levantem" contra o governo e a inação da sociedade, são os primeiros a pedir que a tropa de choque baixe a borracha nos "vagabundos" quando eles fecham a 23 de Maio e atrapalham o deslocamento dos seus SUVs rumo à happy-hour nos Jardins.

Acuados, os políticos "de esquerda" se horrorizam com as cenas de sacos de lixo pegando fogo no meio da rua e se apressam a condenar na TV os atos de "vandalismo", pois morrem de medo que essas fogueiras causem pavor em uma classe média cada vez mais conservadora e isso possa lhes custar preciosos votos na próxima eleição.

Enquanto isso a molecada, no seu saudável inconformismo, vai para as ruas defender – FUNDAMENTALMENTE – o seu direito de sonhar com um mundo diferente. Um mundo onde o ensino, os trens e os ônibus sejam de qualidade e gratuitos para quem deles precisa. Onde os cidadãos tenham autonomia de decidir sobre o que devem e o que não devem fumar ou beber. Onde os índios possam nos mostrar que existem outros modos de vida possíveis nesse planeta, fora da lógica do agribusiness e das safras recordes. Onde crenças e religião sejam assunto de foro íntimo, e não políticas de Estado. Onde cada um possa decidir livremente com quem prefere trepar, casar e compartilhar (ou não) a criação dos filhos. Onde o conceito de Democracia não se resuma à obrigação de digitar meia dúzia de números nas urnas eletrônicas a cada dois anos.

Sempre vai haver quem prefira como modelo de estudante exemplar aquele sujeito valoroso que trabalha na firma das 8 da manhã às 6 da tarde, pega sem reclamar o metrô lotado, encara mais quatro horas de aulas meia-boca numa sala cheia de alunos sonolentos em busca de um canudo de papel, volta para casa dos pais tarde da noite para jantar, dormir e sonhar com um cargo de gerente e um apartamento com varanda gourmet.

Não é meu caso. Não tenho nem sombra de dúvida de que prefiro esses inconformados que atrapalham o trânsito e jogam pedra na polícia. Ainda que eles nos pareçam filhinhos-de-papai, ingênuos em seus sonhos, utópicos em suas propostas, politicamente manobráveis em suas reivindicações, irresponsavelmente seduzidos pelos provocadores de sempre.

Desde a Antiguidade, esses jovens ingênuos e irresponsáveis são o sal da terra, a luz do sol que impede que a humanidade apodreça no bolor da mediocridade, na inércia do conformismo, na falta de sentido do consumismo ostentatório, nas milenares pilantragens travestidas de iluminação espiritual.

Esses moleques que tomam as ruas e dão a cara para bater incomodam porque quebram vidros, depredam ônibus e paralisam o trânsito. Mas incomodam muito mais porque nos obrigam a olhar para dentro das nossas próprias vidas e, nessa hora, descobrimos que desaprendemos a sonhar.